Nas estradas e encruzilhadas da vida, liberto das roupagens da vaidade e da jactância, tento merecer esta minha condição de ser vivo.

quarta-feira, 20 de junho de 2018

02 - POESIA VIVA * Meus versos


TEMPO DE SORTILÉGIO
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Meus versos

(Ícaro, Chagall)


Pediste-me um poema original

como se eu fosse um mago jardineiro

cuidando com desvelo, num canteiro,

de raro e fascinante roseiral.



Quem dera eu fosse o mágico poeta

que em rosas as palavras transfigura!

Vermelhas rosas ébrias da ternura

que dissimula uma paixão secreta.



Dos deuses enjeitado, como ousar

as siderais alturas onde os astros

são círios a velar ainda Orfeu?



Perdidos neste chão de malmedrar,

meus versos são efémeros os rastros

de quem não teve a graça de voar...




José-Augusto de Carvalho
20 de Junho de 2018.
Alentejo * Portugal

02 - POESIA VIVA * O verbo

TEMPOS DO VERBO (1990)
O VERBO



Desceu o verbo em luz e as sombras, noite e treva,
cederam seu lugar a raios deslumbrados.
Do fundo da caverna, o espírito se eleva
e os longes ganha, aquém e além, iluminados.

Horizontes de espanto, enleios de aventura,
rasgaram os grilhões e os passos hesitantes
ensaiam infantis anseios de procura
nos campos de trigais maduros e ondulantes.

Princípio é este tempo, o verbo conjugado,
a fome e a sede, a graça viva da alvorada,
numa conjugação de massa levedada
e vinho novo, claro, livre, embriagado.

E o tempo é todo o tempo o verbo que anuncia
o fim da sombra, a luz que raia e aquece --- o dia!


José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 27 de Janeiro de 1988.