Era um povo singular
nesta faixa acantonado,
erecta e rectangular,
desenhada à beira-mar
com notas de ausência e Fado.
.
Um dia, mais atrevido,
ousou ir molhar os pés.
Depois, apurou o ouvido
para entender o sentido
do vai e vem das marés.
.
A dolente melodia
era um canto de embalar
que de longe prometia
um barco de fantasia
e sonhos de céu e mar.
.
E este povo singular,
indeciso, ponderava
a renúncia de ficar
na segurança do lar
que a terra firme lhe dava
.
ou aceitar a aventura
do desafio do mar
e ganhar-se na tontura
das lonjuras da loucura
onde ousar já é chegar…
.
Largou enxadas e arados,
largou trigais e moinhos,
e por mares encapelados
e ventos desesperados,
na distância, abriu caminhos…
.
Dobrou os Cabos da Dor,
da Desgraça e da Tormenta.
Ganhou promessas de amor
doutra cor e com sabor
a noz moscada e pimenta.
.
Deu à Pátria a dimensão
das partes todas do Mundo.
Foi por sonho e condição
caravela de evasão
que jamais irá ao fundo.
.
Quando os ventos da mudança
sopraram do pátrio chão
numa danada aliança,
ficou presa a esperança
neste cais em negação…
.
Que pesadelo te amarra
a urgência de navegar?
Que plangência de guitarra
em renúncia encerra a barra
a um povo filho do mar?
.
José-Augusto de Carvalho
25 de Outubro de 2013.
Viana*Évora*Portugal
(Da colectânea em preparação «Canto Revelado»)
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